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Especial: Ações pedirão prisão de militares por 24 mortes na ditadura; O risco de uma Comissão do Acerto de Contas

Vítimas foram capturadas em SP; procurador sustenta que Lei da Anistia não se aplica a desaparecimentos forçados .

Tese do Ministério Público foi derrotada no caso Curió, na semana passada, mas ainda será julgada pelo STF
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BERNARDO MELLO FRANCO .

O Ministério Público Federal prepara a abertura de ações criminais contra militares suspeitos de participar do desaparecimento, em São Paulo, de 24 pessoas que atuaram na luta armada contra a ditadura militar (1964-85).

As investigações correm em sigilo. A Procuradoria pedirá a prisão dos ex-oficiais alegando que o desaparecimento forçado é um crime continuado, como o sequestro. Assim, os acusados não seriam beneficiados pela Lei da Anistia, que veta punições por atos cometidos até 1979.

A Justiça Federal do Pará rejeitou esta tese na sexta-feira passada ao recusar a abertura de ação criminal contra o coronel reformado do Exército Sebastião Curió, denunciado por sequestros na Guerrilha do Araguaia (1972-75).

A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) já levou o mesmo argumento ao STF (Supremo Tribunal Federal). O julgamento do recurso foi marcado para hoje, mas deve ser adiado a pedido da entidade.

As 24 vítimas de São Paulo desapareceram após ser presas por agentes do Dops (Departamento de Ordem Política e Social) e da Oban (Operação Bandeirante), depois rebatizada de Doi-Codi.

A Folha confirmou que a lista inclui o estudante Luiz Araújo, da ALN (Ação Libertadora Nacional), e o bancário Aluízio Palhano Ferreira, da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), na qual militou Dilma Rousseff.

Os dois desaparecidos passaram pelo Doi-Codi em 1971. O coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que comandava a unidade na época, deve ser um dos réus nas novas ações. Ele não foi localizado ontem e negou a prática de crimes em outras ocasiões.

O procurador Sergio Suiama, que conduz as investigações, afirma que o STF já equiparou o desaparecimento forçado ao sequestro ao autorizar a extradição de dois militares argentinos.

"Não se trata de revanchismo nem de manobra do Ministério Público. Nossa posição já foi adotada pelo Supremo para autorizar a prisão desses estrangeiros", diz ele.

"A Anistia só vale para crimes cometidos até 1979, o que não inclui o desaparecimento de vítimas cujos corpos nunca foram encontrados."

O procurador já começou a ouvir testemunhas, mas ainda não fixou data para ajuizar as ações criminais.

O risco de uma Comissão do Acerto de Contas

Denis Rosenfield

Não combatia pela liberdade quem queria uma ditadura comunista; são maus exemplos os países que, por revanchismo, barram a reconciliação nacional.

O compromisso da história, enquanto conhecimento, é com a verdade, não importando o quão cruel possa ser a realidade retratada.

A constituição da comissão da Verdade deveria ser pautada pela imparcialidade e não por qualquer viés ideológico, algo que só deformaria o seu próprio trabalho. Uma comissão dirigida contra os militares seria um evidente contrassenso, pois, então, o seu nome deveria ser comissão de um Acerto de Contas.

Nessa história, não há mocinhos nem bandidos. Uma comissão da Verdade deveria ter, evidentemente, à sua disposição uma abertura irrestrita de todos os arquivos e documentos do período, não importando, para isso, quais poderiam ser os indivíduos ou grupos eventualmente prejudicados.

Uma nação tem o pleno direito de conhecer a sua história, quando mais não seja para que as próximas gerações possam aprender com os seus acertos e com os seus erros.

Não cabe, portanto, um trabalho voltado somente contra militares e policiais torturadores que se desviaram de suas funções.

Seus nomes não deveriam ser preservados quando o seu envolvimento for devidamente comprovado. Ele deveria também abarcar os que procuraram instalar no Brasil uma ditadura comunista e, para isto, utilizaram-se de assassinatos, sequestros, roubos e "justiciamentos" de militantes de esquerda.

Tornou-se usual nesses últimos anos apresentar os que tentaram promover a ditadura comunista no Brasil, em suas vertentes cubana, maoísta, soviética e outras, como se fossem combatentes da liberdade. A deturpação dos fatos é completa. Não lutavam eles pela democracia nem pela liberdade.

O Brasil apresenta, dentre os países da América Latina, um modelo único de transição de um regime autoritário para um democrático.

Seu norte foi o da conciliação nacional, seu instrumento foi a Lei da Anistia, válida para todos os lados, e os seus agentes mais importantes foram os líderes do então MDB, as entidades da sociedade civil, os militares que entraram em uma linha democrática e os políticos defensores do regime que fundaram o PFL.

A transição não foi obra da esquerda armada que tinha sido previamente derrotada militarmente.

Logo, pretender revogar a Lei da Anistia é um ato que tem como objetivo substituir a concórdia estabelecida pela discórdia.

Aduzir como argumento que outros países latino-americanos fizeram essa revisão de nada vale, sobretudo considerando o estado desses outros países, presos a revanchismos e a clivagens internas que impedem uma reconciliação nacional e o próprio desenvolvimento social, econômico e político.

Enquanto isso, o Brasil chega à posição de sexta economia do mundo, graças à sua estabilidade institucional e ao seu ambiente político.

Nessa perspectiva, a posição da presidente Dilma Rousseff de ameaçar punir os militares que reagiram às declarações de duas ministras que propugnaram pela revogação da Lei da Anistia não se coaduna com a imparcialidade que deve presidir a comissão da Verdade.

Se fosse para chamar os militares da reserva à hierarquia (saliente-se que, na reserva, eles têm direito à livre emissão de posições políticas), ela deveria ter feito a mesma coisa com as ministras envolvidas, desautorizando-as.

Sob essa ótica, os militares têm razão em ter reagido, pois estão defendendo uma lei de pacificação nacional. Ministras não são indivíduos privados, mas pessoas públicas. De fato, o que elas fizeram foi dar um impulso a um processo de formação da opinião pública que viesse a propiciar uma revogação dessa lei.

Decisões do Supremo podem ser modificadas quando os seus membros são substituídos. A comissão da Verdade não pode se prestar a esse papel, sob pena de se tornar uma comissão do Acerto de Contas.

DENIS ROSENFIELD, 61, doutor pela Universidade de Paris 1, é professor titular de filosofia da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul)

Fonte: / NOTIMP

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Lei da Anistia: polêmica no STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) deve encerrar nesta quinta a questão sobre o alcance da Lei de Anistia, aprovada em 1979. A polêmica foi reaberta na semana passada com a decisão do Ministério Público de denunciar o major da reserva Sebastião Curió pelo desaparecimento de cinco guerrilheiros do Araguaia, em 1974.

Conforme prognóstico de ministros, o STF deve rejeitar o recurso da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e reafirmar que a Lei de Anistia, de 1979, beneficiou militantes de esquerda e agentes do Estado que cometeram crimes cometidos durante a ditadura militar A OAB argumenta que o Supremo foi omisso ao não se pronunciar, de acordo com a Ordem, sobre os crimes de desaparecimento forçado. O recurso da OAB será relatado pelo ministro Luiz Fux.

De acordo com ministros da Corte, a lei teria anistiado também responsáveis por crimes de sequestro – ou desaparecimento forçado – praticados durante o regime militar e cujas vítimas não apareceram até hoje – vivas ou mortas. Por esse entendimento, Sebastião Curió, que foi denunciado por desaparecimento forçado de militantes de esquerda, também estaria anistiado.

Na sessão, os ministros devem reafirmar a decisão do tribunal de 2010 que julgou ter sido a Lei de Anistia recepcionada pela Constituição de 1988. Nesse ponto, devem julgar que a condenação do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) não altera a decisão do STF de que a Lei de Anistia estaria amparada na Constituição e seria ampla, geral e irrestrita.

Em 2010, a CIDH condenou o Brasil a investigar e punir criminalmente agentes do Estado responsáveis pela prisão, tortura e desaparecimento de 70 militantes de esquerda envolvidos na guerrilha do Araguaia, em 1974.

Na sua decisão, posterior ao julgamento pelo STF, a Corte Interamericana entendeu que a Lei de Anistia do País estaria em confronto com a Convenção Americana por impedir a punição de agentes do Estado que cometeram crimes durante a ditadura.

Fonte: / NOTIMP

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Governo Dilma trabalha para manter a Comissão da Verdade na agenda

Há receio de que setores da sociedade percam o interesse no assunto e se desmobilizem

Alana Rizzo

Esta semana, a presidente da Associação das Avós da Praça de Maio, Estela de Carlotto, participou de reuniões no Ministério da Justiça e na Secretaria de Direitos Humanos. Na Comissão de Anistia, Estela defendeu o envolvimento da população. “Não esperem que a presidente Dilma tome essa medida (de punir torturadores). Ela precisa do apoio do seu povo. Tem que ser uma espécie de onda.”

Estela ficou surpresa com a reação dos militares brasileiros contra o funcionamento da Comissão. “Dilma é o comandante-chefe e é ilícito reverenciar a ditadura,” disse a argentina, cobrando o funcionamento da comissão no País.

Os membros da futura Comissão da Verdade, que foi aprovada pelo Senado em outubro do ano passado, já teriam sido escolhidos pela presidente, que só deve nomeá-los em meados do próximo mês.

Além da proximidade com o Dia do Golpe Militar, o governo quer dar um tempo no desgaste recente provocado por reações dos militares e a iniciativa do Ministério Público Federal (MPF) de pedir a punição de militares por crimes continuados.

A demora na nomeação dos integrantes do colegiado que vai investigar violações de direitos humanos cometidas entre 1946 e 1988 também tem gerado reclamações. “Estamos vivendo uma ansiedade muito grande para conhecer os membros da comissão. A expectativa é grande para esclarecer as realidades locais”, disse Gilney Viana, assessor da Secretaria de Direitos Humanos.

Ações. A pasta deve retomar as buscas por restos mortais de guerrilheiros do Araguaia no próximo mês. Também estuda um projeto conjunto com a Secretaria de Políticas para Mulheres, agora comandada pela ex-presa política Eleonora Meniccuci, sobre mulheres torturadas.

No Ministério da Educação, grupos de pesquisa, vinculados às universidades, preparam uma série de estudos sobre a memória do regime militar.

A falta de punição, no entanto, ainda não é um consenso. “Esse processo (de instalação da Comissão da Verdade) será acompanhado de uma responsabilização. Terá uma dimensão de identificação individual, que as outras comissões não tiveram”, defendeu o secretário Nacional de Justiça, Paulo Abraão. “Será que seremos o único país a ter verdade sem justiça?”, questionou o secretário.

Fonte: / NOTIMP









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