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Aeroportos: Em Guarulhos, vencedor administrará "Torre de Babel"



Rodrigo Pedroso .

Prestes a mudar de mãos, o aeroporto de Guarulhos (SP) é uma promessa de ganho futuro aos vencedores do leilão de hoje. Os substitutos da Infraero terão que administrar uma "Torre de Babel", por onde passam por dia mais pessoas do que a população de 97% dos municípios brasileiros, além de aumentar a capacidade de voos e melhorar a infraestrutura para os diversos de usuários - de brasileiros a estrangeiros.

Os números impressionam, assim como os relatos. Por dia, em média, 130 mil pessoas passam pelo aeroporto, dez mil carros utilizam o estacionamento, 740 voos são realizados e 1,1 mil Big Macs, consumidos. Para limpar, cuidar, vigiar e servir, mais 30 mil funcionários tiram o sustento do local, que conta com 197 pontos comerciais cadastrados, 653 táxis e um serviço de ônibus que liga a região ao aeroporto de Congonhas e outras regiões da capital paulista saindo a cada meia hora. Além disso, na área do aeroporto, há um hotel com 365 quartos.

Com a primeira parte inaugurada em 1985, o Aeroporto Internacional Governador André Franco Montoro custou cerca de US$ 500 milhões à época. Agora, o lance mínimo para que o consórcio vencedor o opere por 20 anos é de R$ 3,4 bilhões, com os investimentos posteriores estimados em R$ 4,6 bilhões pela Secretaria de Aviação Civil (SAC). Em 2011, a receita com a administração de Cumbica rendeu R$ 770,5 milhões à Infraero, que após a venda vai deter 49% das ações de sua maior fonte de faturamento - a estatal ainda opera outros 65 aeroportos no país. Descontadas as despesas, Guarulhos (SP) rendeu R$ 190 milhões líquidos em 2010.

Administrado pela Infraero, o aeroporto de Guarulhos (SP) teve resultado líquido de R$ 190 milhões em 2010

Um dos 80 mil visitantes que vão o aeroporto por dia, em média, a empresária Cleunice Brás foi a Guarulhos junto com outros nove familiares para recepcionar a sobrinha, que voltava dos Estados Unidos após intercâmbio de seis meses. Ela reclamou do acesso ao local, e disse que já chegou a demorar três horas para sair de sua casa, na zona norte de São Paulo, e chegar a Cumbica. "Viajo há 15 anos e não houve mudança significativa nesse tempo. Não temos opção, pois é o único internacional. Quando o voo é doméstico, vamos até Viracopos [em Campinas], que é mais barato e demora menos."

Quem vive de levar e deixar passageiros em Cumbica, distante 25 km do centro de São Paulo, também gostaria de ver melhorias. Hoje, apenas 10 táxis podem ficar enfileirados para receber passageiros. Os outros 643 carros cadastrados para o serviço, que funciona em forma de cooperativa, ficam esperando em um pátio longe do terminal 2, informa o taxista Alex Fernandes. "Quem trabalha o dia inteiro faz uma corrida por turno. São duas horas até chegar na cidade, duas para voltar e, no mínimo, mais duas para esperar na fila até chegar a vez", diz, lembrando que número reduzido de corridas encarece o serviço. Até o centro paulistano, o preço médio é de R$ 88.

O crescimento do aeroporto na última década sem o aumento proporcional da estrutura é a principal fonte das reclamações, na opinião do carregador de malas Mário Rodrigues, que cobra R$ 3 para levar cada mala de um cliente do carro ao check-in. No começo da manhã e no fim da tarde se concentram os horários de pico, com parte das 45 companhias aéreas existentes no local embarcando e desembarcando passageiros. "Antes era bem mais tranquilo, tinha menos gente. Hoje, tem filas enormes para tudo. Se antes eu demorava dez minutos para despachar uma mala, hoje levo 40."

Os números apoiam a percepção do paulistano, que trabalha há 15 anos no local e consegue tirar até R$ 2 mil por mês. Em 2001, a média diária era de 36 mil passageiros. Hoje, é de 80 mil. A infraestrutura, contudo, não aumentou significativamente. De lá para cá, iniciou-se a construção do terminal 3 (atualmente são dois), que tem previsão de término até o fim deste mês. Com a obra, a capacidade do aeroporto vai saltar de 150 mil para 165 mil pessoas, em média, ao dia, entre passageiros e visitantes. O terminal 4, que faz parte do seu plano de expansão, a ser executado pelo novo operador, esta previsto para ser entregue em 2016, com a primeira parte pronta dois anos antes para atender à demanda da Copa do Mundo.

Além dos terminais, a expectativa é que sejam construídos um novo pátio para as aeronaves, um estacionamento com capacidade para 2,2 mil veículos e um terminal de carga. "A situação deve melhorar para mim. No aeroporto de Miami, que é privado, o pessoal paga para usar o carrinho. Nós vamos praticamente o mesmo preço de hoje. Mas tem um pessoal com medo de demissão", diz Rodrigues sobre alguns dos 50 carregadores associados que atuam em Cumbica.

Há também aqueles que estão satisfeitos com o aeroporto. O camaronês Mfongang Alfred, atacante do A. S. Vitória, time de futebol do Congo, estava voltando para casa após pré-temporada no Brasil. A limpeza do local- especialmente dos banheiros - agradou ao jogador de 24 anos. "Fazem um bom trabalho aqui", afirmou.

Fazendo negócios no aeroporto, o angolano T.I. compra roupas femininas e sandálias havaianas no centro de São Paulo e contrata compatriotas para levar a mercadoria para a capital Luanda para revenda - ele, de tanto fazer a viagem, acabou ficando em São Paulo, onde mora. Depois de pedir para não ser identificado com receio da Receita Federal, ele disse que quem compra pouca mercadoria paga a taxa de US$ 200 de excesso de bagagem até 32 kg e embarca com os produtos. Outros embarcam as encomendas em voos cargueiros. O que é levado varia conforme o poder de compra de cada angolano. "Quem tem dez caixas, leva dez. Quem pode comprar cem, embarca cem. A havaiana é a que tem mais procura. Um par, em média, é vendido por US$ 10 dólares lá. Tem muita gente que faz isso, caso contrário não haveria três voos semanais pra Luanda", disse.

Nem todos os estrangeiros, porém, deixam Guarulhos sem problemas. A sueca Sophia Alberg fez escala no país depois de passar as férias no Uruguai. No retorno ao seu país natal, ela e uma amiga tiveram a bagagem perdida pela companhia aérea. A dificuldade em conseguir informações e a burocracia para conseguir embarcar não devem deixar saudades. "Foi um inferno, na verdade. Ninguém da empresa falava inglês ou espanhol, tivemos que passar por muitas pessoas. Na Suécia os funcionários são mais bem treinados."

O levantamento do quanto toda a economia de Cumbica movimentou no ano passado deve sair apenas em março, mas as empresas apresentam números expressivos. Só o McDonald"s atende todos os dias, em média, 4 mil clientes, que consomem cerca de 1,1 mil Big Macs. A rede Black Coffee, que conta com duas lojas, vende 560 cafés expresso e 750 pães de queijo diariamente, ambos a R$ 3,40.

As cifras grandiosas envolvendo as operações do aeroporto ficaram alheias à cortadora de cana aposentada Maria do Carmo Silvino, que estava em sua segunda visita à Cumbica. A primeira foi 11 dias antes, quando chegou de Maceió (AL), quando andou de avião pela primeira vez. Com passagem de volta para dali a 20 dias, pediu ao filho, o assistente técnico Edmilson Silvino, que a levasse para ver melhor o aeroporto. "É muito grande isso aqui", disse, enquanto olhava pela janela do saguão um dos aviões sendo abastecido. Aos 66 anos, Maria nunca imaginou que pudesse voar. Foi Edmílson que comprou as passagens. "Se ela viesse de ônibus custaria R$ 380 e passaria três dias na estrada. Achei uma de avião por R$ 300 na promoção. Hoje está bem mais acessível. Eu mesmo viajei pela primeira vez há cinco anos. De lá para cá minha vida melhorou muito", disse.

Edmílson faz parte da chamada Classe C, que ganhou poder de compra nos últimos anos com o aquecimento da economia nacional, virou alvo das companhias aéreas e ajudou a lotar os aeroportos do país. O novo público, no entanto, não é visto com bons olhos por antigos usuários. Para Sérgio Buenos, que frequenta Cumbica desde a inauguração, "o local está degradado". "Antes, tinha menos voos, mais espaço, mais salas VIP. Agora, virou Maracanã". O advogado de 68 anos acredita que o aeroporto foi projetado para uma capacidade inferior à que está operando atualmente. "Mostraram-se incapazes de fazer as mudanças necessárias. Privatizar será bom, e se for feito direito não vai elevar muito as tarifas, pois deve haver ganho de escala. Mas prefiro pagar mais para ter um serviço melhor." A Infraero cobra de tarifa de embarque RS 20,66 para os voos domésticos e R$ 68,74 para internacionais.

A previsão da Secretaria de Aviação Civil é que entre 2010 e 2016 o número de passageiros de Cumbica cresça 8,8%, com a população flutuante - passageiros, visitantes e trabalhadores - estabilizando em 2020. No que depender de Edmílson Silvino, ele vai continuar usando o aeroporto. "Tem gente que não quer que a classe média ande de avião. Mas eles não podem fazer nada, vão ter que nos aturar."

Fonte: / NOTIMP

Foto: Andomenda









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