Aos poucos, mulheres conquistam os céus
Elas são 1,4% do total de pilotos do Brasil, mas o número de licenças cresce a cada ano .
No meio de uma sala com colegas de trabalho, Gabriela Carneiro Duarte, de 36 anos, levanta da cadeira e abre os botões do paletó. Deixa à mostra uma camisa branca, gravata, calça social escura e sapato preto. "Olha aqui, olha como fica "canastrona"", diz, imitando gestos masculinos que fazem as outras caírem na risada. Gabriela zombava da roupa de piloto, profissão que escolheu em 1996 e que vem se tornando mais comum no Brasil.
Se comparado ao de homens, o número de mulheres no comando de aviões ainda parece pequeno: hoje, elas representam 1,4% do total de 13.947 pilotos de avião no País. Mas a quantidade de licenças emitidas para mulheres, que já foi apenas 44 em 2009, praticamente dobrou - para 86 - no ano passado. Em 2011, até julho, já foram 68. Todas as companhias nacionais têm mulheres em seu quadro de comandantes ou copilotos. A Gol tem 25; a TAM, 33.
É para voar em companhia aérea que Rafaela Loss Garcia, de Garibaldi, no Rio Grande do Sul, está estudando. Aos 19 anos, ela já tirou o brevê e é a piloto comercial mais jovem do País. Voa em um Sêneca, mas quer pôr as mãos em um Boeing ou Airbus em breve. "Minha mãe ainda tem receio, vai no aeroclube comigo e fica me esperando voar."
Quem também começou na profissão foi Paula Petean, de 29 anos - filha de piloto, diz que praticamente nasceu na cabine do avião. O pai ajudou a fazer o tradicional rito de batismo comum a todo recém-formado: um banho de óleo queimado depois do primeiro voo solo. Com uma ressalva. "Pouparam meu cabelo. Senão, teria de raspar", conta Paula, hoje copiloto da Gol.
Igualdade. Uma das pioneiras no Brasil é Jaqueline Ortolan, de 42 anos, que começou como copiloto da TAM há 15. Para conseguir pagar as horas de voo que precisava para se formar, trabalhou como comissária e morou em um aeroclube no Maranhão. "Se hoje já é diferente, imagina naquela época. Mas o preconceito é uma coisa que não cabe mais. O treinamento é o mesmo, o salário é o mesmo de qualquer homem na profissão", diz a comandante Ortolan, como é conhecida na empresa.
Ela conta que até já ouviu algumas piadinhas, mas tirou de letra. "Ah, ainda bem que não tem baliza lá em cima, né?", relembra. "Isso é uma minoria. O comum mesmo é despertar uma curiosidade saudável nas pessoas. Às vezes, estou com amigos que conheço há anos e começa aquele papo "então, eu queria te perguntar uma coisa, morro de medo de turbulência..."", conta a comandante Ortolan.
Gabriela Carneiro Duarte - que é comandante da Gol - já recebeu até cartinha de uma passageira parabenizando-a pelo trabalho. "Ela falava que eu era uma guerreira e me desejava sorte. Só que teve vergonha de entregar para mim, entregou para o comissário", conta.
Como qualquer aeronauta, a escala de trabalho das pilotos é puxada - geralmente, são seis dias viajando e um em casa. Quando elas engravidam, depois da licença-maternidade, as empresas as deixam fazer uma escala especial: voos de bate-volta para que elas possam dormir em casa e passar mais tempo com os filhos.
"É uma rotina diferente. Posso até não estar todo fim de semana com meus filhos, mas, em compensação, posso ganhar uma terça-feira de folga para ficar em casa com eles, levá-los na escola", conta a comandante Ortolan, que é mãe de dois. "Quantas mães têm isso?"
PARA SER PILOTO
Piloto privado de avião (PP)
Ter 18 anos
Ter concluído o ensino fundamental
Ser aprovado na banca de exames da Agência Nacional de Aviação (Anac)
Ter um certificado de capacidade física emitido pela entidade
Piloto comercial (PC)
Ter 18 anos
Ensino médio completo
Certificado de capacidade física da Anac
Aprovação em curso de formação de pilotos homologado
Ser aprovado na banca de exames da Anac
Ter mais de 21 anos
Ter 2º grau completo e aprovação em testes da Anac
Ter um mínimo de 1,5 mil horas de voo como piloto
Dessas, 250 horas têm de ser como piloto em comando (pode ser 100 horas como comandante e o restante como copiloto sob supervisão de um piloto com licença PLA)
Pelo menos 75 horas de voo por instrumento, das quais até 30 horas em simulador de voo
100 horas de voo noturno
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Foto: Azul