China e Brasil negociam de novo em maio
Satisfeitas com os resultados da primeira etapa da visita da presidente Dilma Rousseff à China, concluída ontem em Pequim, as autoridades brasileiras já preparam para iniciar em maio uma segunda etapa de negociação com os chineses, que tratará das barreiras ao comércio e planos de investimento entre os países. Os chineses são mais objetivos que os Estados Unidos no tratamento das questões bilaterais, afirmou ao Valor o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel.
"Com o presidente [dos Estados Unidos, Barack] Obama, havia mais empatia, entendíamos o inglês, houve um clima afável", comentou ele. "Na China compensam as dificuldades da tradução com um protocolo ultrasofisticado, mas o presidente [chinês] Hu Jintao teve uma objetividade que o Obama não teve", comparou o ministro. "Com Obama houve empatia, mas não resultado; com Hu Jintao não se criou aquele clima familiar, mas teve resultado."
A segunda fase de discussões com a China envolverá a ida ao Brasil de algumas das principais autoridades do país: o ministro do Comércio, Chen Demin, chefiará em maio uma missão comercial e a delegação chinesa na reunião da Comissão Econômica e Financeira Brasil-China. No segundo semestre, o Brasil receberá a visita do vice-primeiro ministro, Wang Quishang, que participará da Comissão de Alto Nível Brasil-China (Cosban). A reunião da Cosban vinha sendo adiada pelos chineses e é interpretada pelo governo brasileiro como compromisso da China em estreitar a relação com o Brasil e tentar eliminar atritos bilaterais. "Trataremos das questões como as tarifas contra produtos manufaturados brasileiros, investimentos brasileiros em siderúrgicas chinesas e outros temas pontuais", disse ao Valor o ministro de Relações Exteriores, Antônio Patriota.
"Se examinarmos as questões que colocamos aos chineses, elas já produziram resultados, como a liberação de importação de carne suína e compra de aviões da embraer", citou Patriota, para justificar o otimismo do governo brasileiro, que obteve, na China, a promessa formal do presidente Hu Jintao de esforço para aumentar o valor agregado das importações de produtos brasileiros. "Na visita que fizemos em janeiro, eles disseram que fariam um esforço, e fizeram", argumentou.
Nem tudo é harmonia, porém. A reunião de maio deverá servir também para discutir a crescente pressão dos empresários brasileiros contra produtos chineses, que já são objeto de nove pedidos de salvaguardas (sobretaxas e cotas) a serem analisados em breve pelo Ministério do Desenvolvimento.
Embora não tenha tratado diretamente das queixas da indústria siderúrgica brasileira sobre as dificuldades em investir na China, o governo chinês "entendeu o recado", diz o ministro Pimentel, que também avalia como "muito bom" o resultado da visita. "A ideia básica da presidenta Dilma, com a qual eles concordaram, é que daqui pra frente o relacionamento tem de ter reciprocidade", disse. "Significa que se não pode abrir siderúrgica aqui não pode abrir lá também não, por exemplo."
Pimentel contou ao Valor que Hu Jintao "foi direto ao ponto" e tomou a inciativa de anunciar a decisão de compra de 35 aviões da embraer assim que Dilma mencionou, de passagem, a embraer como exemplo de cooperação entre os dois países. Os chineses vinham relutando em autorizar a compra de aviões da empresa e o uso, na construção de outro tipo de aeronave, da fábrica originalmente criada na China pela embraer e pela chinesa Avic para fabricação do ultrapassado EMB 145. A fábrica foi autorizada a montar jatos executivos e Pimentel, otimista, crê que, em maio, os governos poderão falar em encomendas adicionais às anunciadas nesta semana.
"A embraer vê demanda para até 80 aviões EMB 190; eles devem autorizar aos poucos", espera o ministro. Ao reconhecer a demora dos chineses no atendimento dos pedidos brasileiros, Pimentel contou seu diálogo com o ministro Chen Demin, em reunião na terça-feira. "Vocês têm de entender que as coisas na China são demoradas", alertou Demin. "Mas sua economia está crescendo bem rapidamente", respondeu o brasileiro. "Estou falando de decisão, não de produção", esclareceu o chinês.
O diálogo terminou em risos quando Pimentel presenteou Demin com a camisa da seleção brasileira, autografada pelo jogador Robinho. "Sabe o simbolismo da camisa? É para jogarmos no mesmo time", disse Pimentel a Demin.
"No fundo, a competição da China, se soubermos trabalhar, não é ruim", comentou o ministro. "Nos força a ficar mais competitivos, mais espertos, mais atentos à mudança tecnológica", disse. (SL)
Fonte: VALOR ECONÔMICO / NOTIMP
