O Aeroporto do Petróleo
Localizado perto das Bacia de Campos e de Santos, único aeroporto internacional privado do País vira base para a indústria petrolífera.
Alexandre Rodrigues.
O sol se esconde entre nuvens num fim de tarde da Região dos Lagos enquanto funcionários do Aeroporto Internacional de Cabo Frio miram o céu. No pátio, eles estão a postos há mais de uma hora com empilhadeiras e possantes elevadores de grandes volumes para receber um grande avião de carga. Mas o Boeing 767 cargueiro que aterrissa não protagoniza nenhuma ocasião especial.
Com vantagens geográficas e logísticas, o aeroporto de Cabo Frio, no litoral fluminense, está se tornando uma importante base de importação para a indústria do petróleo na Bacia de Campos e tem recebido um fluxo cada vez maior de aviões cargueiros. Pelo menos 160 são esperados este ano. Companhias de carga, como Absa, Volga-Dnepr e Kalitta Air operam pelo menos dois voos semanais.
Só entre 2008 e 2009, o volume de cargas do terminal cresceu 65%, quase triplicando o faturamento, que alcançou R$ 40 milhões. Segundo a administração do aeroporto, os números de 2010 ainda em consolidação apontam crescimento bem mais modesto, mas com a manutenção do patamar de mais de 15 mil toneladas movimentadas por ano.
Embora ainda pouco conhecido, o terminal de Cabo Frio é o único aeroporto internacional administrado pela iniciativa privada no País e oferece uma infraestrutura para operações de carga que não se espera para um aeroporto de interior, a começar pela pista impecável. Com quase três quilômetros de extensão, incluindo uma área de escape, ela permite o pouso em segurança de gigantes como os Boeings 777 e 767, o MD-11, o DC-10 e o gigante ucraniano Antonov. No final de janeiro, um jumbo (Boeing 747) pousou na cidade com três helicópteros Sikorsky, modelo S-76. Os aparelhos integram agora a frota de seis helicópteros que operam o transporte de trabalhadores de empresas como Petrobrás, OGX e Devon para as plataformas de produção de petróleo em alto mar a partir do aeroporto de Cabo Frio.
A movimentação triplicou em um ano. São quase cem pessoas em trânsito por dia, com direito a um terminal exclusivo para a companhia de táxi aéreo que presta serviço para a Petrobrás. A previsão é ter 30 helicópteros operando até o fim do ano.
Aperitivo
Os números do Aeroporto de Cabo Frio parecem apenas um aperitivo diante do que deve acontecer na região nos próximos anos com o início da exploração comercial das reservas de petróleo da camada pré-sal. As empresas do setor, que deverão injetar mais de R$ 370 bilhões na economia brasileira só nos próximos quatro anos, importam cada vez mais equipamentos. "Com a posição geográfica da cidade, o aeroporto está perto tanto da Bacia de Campos quanto da de Santos, além da sinergia natural com o Porto do Forno, em Cabo Frio. A empresa pode importar um equipamento de avião e embarcar num navio a sete quilômetros", conta Francisco Pinto, sócio e presidente do conselho da Costa do Sol, concessionária que administra o aeroporto.
"O raciocínio que fazemos hoje é de que é grande a probabilidade que se repita em Cabo Frio o desenvolvimento que se viu em Macaé, que concentrou a primeira fase da operação do petróleo justamente por ter porto e aeroporto", diz.
O terminal de Cabo Frio ainda aproveita a vocação turística da região, que tem cidades vizinhas como Búzios e Rio das Ostras, para explorar o transporte de passageiros. O aeroporto já tem sete voos semanais regulares de TAM, Trip e Pantanal com ligações para Rio, São Paulo, Belo Horizonte e Juiz de Fora.
Companhias sul-americanas, como Pluna e Lan, operam ligações na alta temporada, o que também aumenta o movimento de voos fretados. Só neste verão, 40 mil pessoas já chegaram à região dos Lagos por meio do aeroporto.
Na verdade, a vocação original do aeroporto era o transporte de passageiros. Inaugurado em 1998 numa parceria entre os governos federal e estadual, ele foi municipalizado no ano seguinte. A prefeitura então o privatizou. Vencedora da licitação para uma concessão de 22 anos, a Costa do Sol viu o número ainda pequeno de passageiros minguar logo em seguida, em 2001, com a retração da aviação civil após o 11 de setembro de 2001.
A concessionária então descobriu o nicho da carga e viu o faturamento se multiplicar depois de dois anos de prejuízos. Aos investimentos públicos de R$ 50 milhões em pistas, ampliações, pátios e desapropriações quando da construção do primeiro módulo do terminal de passageiros em meio ao terreno de antigas salinas, a concessionária acrescentou inversões de R$ 30 milhões para equipar o terminal de cargas e passou a colher mais de 90% do seu faturamento da movimentação de cargas.
Hoje, Pinto e seus quatro sócios buscam um novo parceiro investidor para consolidar o aeroporto, viabilizar um condomínio logístico industrial no entorno e aproveitar todas as potencialidades da operação. "Temos consciência de que hoje nosso negócio é maior do que a nossa empresa. A bateria já está acabando", diz Pinto, rejeitando a possibilidade de venda da empresa.
Para ele, a gestão privada facilitou na agilidade para tomar a decisão de investir para mudar o foco da operação. "Se não tivéssemos ousado, não teríamos conseguido recuperar os prejuízos e a concessão teria fracassado. É preciso ter a estrutura antes para poder atender. Se for esperar a demanda para então fazer a estrutura, ela vai para outro lugar."
Primeiro impacto
O aumento da movimentação no Aeroporto Internacional de Cabo Frio está trazendo para a cidade o primeiro impacto econômico direto da indústria do petróleo. Até agora, a cidade de 186 mil habitantes beneficiava-se apenas dos tributos da exploração na costa. Segundo dados da prefeitura de Cabo Frio, a cidade recebe entre R$ 10 milhões a R$ 12 milhões de royalties e participações especiais da exploração de petróleo na costa, cerca de 3,5% do que arrecada o Estado do Rio com o petróleo.
Ricardo Valentim, coordenador da área de Indústria, Comércio e Trabalho da Prefeitura de Cabo Frio, diz que o aumento do pouso de cargueiros em Cabo Frio refletiu-se na queda do volume de carga recebido pelo Porto do Forno. No entanto, diz que o aeroporto impactou mais a economia da cidade com o aumento do fluxo de pessoas ligadas à indústria do petróleo ou de turistas.
Competimos em pé de igualdade com o Galeão, afirma administrador
O administrador do aeroporto de Cabo Frio, Jorge Schettini, conta que, em um ano e meio, aumentou o número de empregados de 40 para 150. "Nossa demanda teve um salto imenso e tivemos de treinar o pessoal local com treinamentos aqui mesmo, com cursos certificados pela Anac", diz."O diferencial na atividade de carga é a logística. Tudo tem de ser rápido e perfeito para que o avião não fique mais do que uma hora e meia em solo para descarregar. Tempo é custo. Temos equipamentos que muitos aeroportos grandes não têm. Competimos em pé de igualdade com Campinas ou Galeão", orgulha-se o administrador.
"Quando abre seleção (para trabalhar) no aeroporto, todo mundo quer", afirma o ex-técnico de informática Roberto Rivelino, de 40 anos, que agora trabalha como agente de proteção de aviação civil em Cabo Frio, com salário mensal de R$ 1,4 mil.
Morador da vizinha São Pedro da Aldeia, ele espera que a região ganhe mais com o petróleo. "Aqui não tem emprego, só no comércio. Quem quer ganhar um salário melhor tem de ir para Macaé", afirma. "Eu nunca tinha visto um avião desses de perto, mas sinto orgulho de ter aprendido tudo sobre eles e trabalhar aqui, onde posso crescer", conclui Rivelino.
Fonte: O ESTADO DE SÃO PAULO / NOTIMP