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Para além da inconfidência






Silvio Queiroz.

No meio do faroeste em que a diplomacia global foi imersa pelos vazamentos do WikiLeaks, a parte que coube ao Brasil contém algo além das dissonâncias e desinteligências entre Itamaraty e Departamento de Estado, Planalto e Casa Branca. Os relatos americanos sobre o país em torno do tema delicado do terrorismo, que nem mesmo é tipificado na legislação penal brasileira, confirmam a impressão de que o desencontro de conceitos e discursos funciona quase como biombo para uma cooperação prática considerada frutífera pelas autoridades de ambas as partes envolvidas com o aspecto mais pragmático — e menos ideológico — do tema.

Em conversa reservada com a coluna, uma fonte bem colocada do lado brasileiro ressaltou que não se resume à retórica a preocupação de altas esferas institucionais com a presença e a atividade de células extremistas, e não apenas as que têm raízes no Oriente Médio. No âmbito policial e judicial, têm sido monitoradas ofensivas de recrutamento de militantes, inclusive com o recurso de viagens ao mundo islâmico a pretexto de formação religiosa. Até recentemente, entre os representantes dos órgãos envolvidos nesses esforços, era consenso que o país caminha para tornar-se alvo de terrorismo dentro de poucos anos. Alguns, porém, já consideram essa avaliação superada pela realização de eventos do porte da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016, precedidas pela Copa das Confederações (em 2013) e pelos Jogos Militares (em 2012).

Esse mesmo funcionário relata que é constante e fluido o diálogo com contrapartes não apenas dos Estados Unidos, mas da Europa, do Oriente Médio e, naturalmente, dos países vizinhos. Do ponto de vista desses atores, o fato de que um terrorista seja vigiado e eventualmente detido no Brasil é o que importa — e não a opção das autoridades brasileiras de enquadrar o “alvo” por outros delitos, como documentação irregular. Noves fora, quando um suspeito de integrar redes de apoio das Farc é preso, como ocorreu este ano, no Amazonas, o que mais interessa aos colombianos é que ele seja neutralizado e, se possível, extraditado ou deportado para enfrentar a Justiça em seu país.

Vizinhos em guarda
A operação da polícia gaúcha para capturar em Porto Alegre possíveis foragidos da operação policial-militar contra o narcotráfico nas favelas do Rio reforça a preocupação com a rearticulação das redes criminosas golpeadas com a ocupação da Vila Cruzeiro e do Alemão. Tanto mais por se tratar de um estado de fronteira. É sintomático que o ministro Nelson jobim tenha acabado de firmar acordos de cooperação nesse tema com o colega boliviano. O governo e as autoridades militares de La Paz já manifestaram o receio de que traficantes brasileiros tentem refugiar-se por lá, onde já adquirem a maior parte da cocaína e da pasta de coca que processam ou vendem por aqui.

Nunca é demais lembrar a trajetória de Fernandinho Beira-Mar: quando escapou de Contagem (MG), em 1997, escapuliu para o Paraguai e passou a cuidar in loco de plantações de maconha. Três anos mais tarde, estava na Colômbia operando tráfico internacional, laboratórios de cocaína e cultivos de coca.

Por que agora?
As opiniões se dividem sobre o sentido do reconhecimento oficial do Estado palestino pelo Brasil, a menos de um mês da troca de governo. Há quem veja na iniciativa a conclusão natural da política de aproximação com o mundo árabe, marcante desde os primeiros meses de Lula no Planalto e Amorim no Itamaraty. Sobrariam razões, ao presidente e ao chanceler, para agirem de maneira a associar os próprios nomes a mais esse passo da diplomacia brasileira. Há, no entanto, quem enxergue o propósito adicional de tirar essa questão do caminho do governo Dilma, que já poderia começar os contatos com Israel — a parte desagradada — a partir de um fato consumado, sobre o qual será desusado discutir.

Não é boba
Por sinal, com a escalação confirmada do embaixador Antonio Patriota para assumir o Itamaraty e de Marco Aurélio Garcia para continuar à frente da assessoria internacional do Planalto — falta apenas o anúncio oficial —, fica cravada a opção de continuidade na política externa. A variável que resta para ser equacionada é aquela que está sobre a mesa desde a eleição de outubro: a troca de Lula por Dilma, com as implicações que pode ter inclusive no equilíbrio entre Presidência e MRE. Sintomática, nesse quadro, a definição de Garcia sobre a nova chefe, em entrevista ao Le Monde Diplomatique Brasil: “A Dilma tem uma boa percepção da política internacional, ela não é uma neófita. E terá o Itamaraty para ajudá-la na implementação da política externa”.

Fonte: CORREIO BRAZILIENSE, via NOTIMP




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