Itamaraty é tido como 'anti-EUA', diz Amorim
Chanceler brasileiro considera "normal" a ação diplomática dos EUA e tenta amenizar impacto do vazamento de documentos pelo WikiLeaks.
O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disse ontem que o Itamaraty "sempre foi considerado antiamericano". A declaração foi uma tentativa de amenizar o impacto da divulgação de despachos da Embaixada dos EUA em Brasília. Os documentos revelam que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, teria criticado a antipatia do Itamaraty com relação a Washington.
Amorim considera natural que embaixadas estrangeiras busquem informações sobre o País em órgãos oficiais que não o Ministério de Relações Exteriores. "Esse desejo sempre esteve presente", afirmou pouco antes de receber a premiação da revista Foreign Policy como o sexto mais proeminente "pensador mundial".
Amorim disse que leu o comunicado do Ministério da Defesa, no qual Jobim nega ter feito comentários sobre o Itamaraty ao então embaixador americano Clifford Sobel. De acordo com o despacho de Sobel ao Departamento de Estado, Jobim teria dito que o então secretário-geral das Relações Exteriores Samuel Pinheiro Guimarães odiava os EUA e adotava um comportamento antiamericano. "Quem dita a política externa não é o Samuel, mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e eu", disse.
Segundo Amorim, o conteúdo dos documentos do WikiLeaks sobre o Brasil são "percepções de diplomatas americanos" e não documentos oficiais. Questionado sobre as críticas de Sobel de que as leis brasileiras não tipificam crimes de terrorismo, o chanceler afirmou que é a definição de terror é muito ampla e não tem consenso na ONU.
A respeito das preocupações de vários países do Oriente Médio sobre o programa nuclear do Irã, reveladas em vários documentos vazados, Amorim manteve uma sólida defesa da estratégia do governo brasileiro. Segundo o chanceler, ele e o presidente Lula estiveram na Arábia Saudita e não ouviram nada similar ao teor dos despachos nos quais autoridades sauditas teriam pedido aos EUA o bombardeio de instalações nucleares iranianas.
Amorim citou a avaliação de duas publicações estrangeiras para defender o acordo nuclear assinado entre Brasil, Turquia e Irã, em 17 de maio. Segundo ele, o pacto "entrará para a história como a inauguração de um mundo multipolar".
De acordo com ele, o Irã concordou em negociar com Brasil e Turquia um acordo de troca de urânio enriquecido por combustível nuclear porque via os dois países como "bons garantidores". Outros países, segundo Amorim, não tinham esse grau de credibilidade, do ponto de vista de Teerã.
Na ocasião, relatou o chanceler, o Brasil sabia dos problemas no texto do pacto sobre o aumento do estoque e o enriquecimento de urânio pelo Irã. Mas, para Amorim, esses fatores não haviam sido mencionados como precondições pelos EUA, que teriam encorajado o País a buscar o acordo.
"Em algum momento, algum setor do governo americano passou a achar que as sanções eram mais urgentes e mais importantes do que as negociações", disse o chanceler, se referindo à reação de Washington, que anunciou, um dia depois, ter obtido os votos necessários para impor novas sanções a Teerã. "Hoje, vemos a retomada das negociações com o Irã, que terão como base o acordo de maio. Eu já disse: não vou cobrar direito autoral."
O ministro disse também que é necessária uma avaliação "cuidadosa" das eleições presidenciais no Haiti, consideradas fraudulentas por boa parte dos candidatos. As informações recebidas pelo Itamaraty da Missão da ONU para a Estabilização do Haiti (Minustah), da Organização dos Estados Americanos e do Caricom, segundo Amorim, mostraram que não houve incidentes violentos e as irregularidades não afetaram os resultados. "Tudo tem de ser visto de maneira relativa. É preciso ter muito cuidado e não entrar facilmente em condenações e críticas."
Fonte: O ESTADO DE SÃO PAULO, via NOTIMP