Do político ao técnico
Eliane Cantanhêde.
Celso Amorim, bem ou mal, tem ideias, arroubos e luz própria. Foi um ministro político num governo político.
Antônio Patriota é um diplomata mais introspectivo, formal, cioso da hierarquia. Será um ministro técnico num governo técnico.
A troca de Amorim pelo pupilo Patriota reflete a diferença de Lula para Dilma. Sai uma dupla do barulho, entra o casamento da inexperiência com a discrição na área externa. Não se espere que Dilma, pelo menos no início, vá ousar, perturbar ou correr riscos nessa delicada seara. Patriota menos ainda.
O próximo governo deverá ter um perfil relativamente baixo na política externa, mantendo a prioridade sul-sul e confirmando os votos condescendentes com ditaduras no Conselho de Direitos Humanos na ONU. No máximo dando uma cotovelada ou outra em Washington, só para marcar posição.
Muita gente chiou quando Lula comprou um avião logo ao assumir, mas justiça seja feita: se houve algo útil no seu governo foi o aerolula, que cruzou oceanos, cordilheiras, rios e ideologias pelo mundo afora. Já o inexplicável AeroDilma corre o risco de se tornar um enfeite no pátio da Base Aérea, fazendo a festa de brigadeiros doidos para cumprir as horas de voo num brinquedo tão sofisticado.
O provável é que Lula leve Amorim como seu assessor especial pós-governo e que Dilma (que não gosta do chanceler) delegue a América Latina e os subdesenvolvidos para Marco Aurélio Garcia e empurre os EUA e os ricos para Patriota.
Ela vai visitar Obama, claro, mas vai falar menos, aparecer menos, propor menos e, portanto, criar muito menos confusão do que Amorim-Lula. Só não dá para dizer até onde isso é bom ou ruim.
PS - O que é mais humilhante? Fazer escalas em viagens longas ou o Brasil parecer ao mundo como o novo rico que joga dinheiro fora num avião para cada presidente, com tanta coisa por fazer?
Fonte: FOLHA DE SÃO PAULO, via NOTIMP