Ocupações não são um acaso, mas estratégia
Previsão de Jobim na Defesa indica que a profissionalização das tropas e a proximidade com a sociedade serão frequentes na gestão de Dilma Rousseff.
Edson Luiz.
A atuação das Forças Armadas no Rio de Janeiro, ocupando as ruas com policiais federais e estaduais, é longe de ser acaso ou ocorrência insólita. É, na verdade, parte da estratégia prevista pelo Ministério da Defesa, que inclui aproximar Exército, Marinha e Aeronáutica da sociedade e profissionalizar as tropas. A medida, já adotada em outras ocasiões — mas de forma discreta — está dentro de um plano conjunto traçado pelo governo. Começou a ser desenvolvido depois da posse de Nelson Jobim na pasta, que, desde a sua criação, só abrigou ministros civis. Jobim, aliás, lidera a bolsa de apostas como titular do ministério também no governo Dilma (leia abaixo). A Estratégia Nacional de Defesa, que será executada até 2030, pretende reformular o setor e criar mecanismos para atuação dos militares.
Diferentemente de seus antecessores, Jobim não colidiu com os subordinados e adotou as metas defendidas pelos militares. A Estratégia Nacional de Defesa vai desde o alistamento militar aos investimentos para os próximos 20 anos. A nova política busca unir as três áreas por meio de planejamento. Anteriormente, até as compras eram fragmentadas, e se adquiriam equipamentos aleatoriamente, sem que a outra força fosse informada. Se no início de sua gestão o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) chegou a ser observado com desconfiança de alguns comandados, no término do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ele chega com a confiança dos militares, principalmente por ter assumido grande parte sob compromissos firmados.
Além de tratar de assuntos de soberania, a Estratégia Nacional de Defesa deixa clara a necessidade de melhor formação das tropas e de incentivo à participação de integrantes das diferentes regiões. “Os recrutas serão selecionados por dois critérios. O primeiro será a combinação do vigor físico com a capacidade analítica, medida de maneira independente do nível de informação ou de formação cultural. O segundo será o da representação de todas as classes sociais e regiões do país”, indica uma parte do documento. A melhoria do relacionamento com a sociedade não contempla apenas colocar os blindados na rua em momentos de crise na segurança pública, mas aproximar a sociedade civil dos militares.
Elite
Na ação no Complexo do Alemão, as três Forças Armadas mostraram à população acuada alguns de seus melhores e mais novos equipamentos. Os soldados reunidos para a ação têm experiência em conflitos armados no Haiti e formam a tropa de elite das corporações. “O uso das forças foi oportuno, já que a atuação dos traficantes estava sendo um desaforo”, avalia o coronel da reserva Geraldo Cavagnari, estrategista militar e integrante do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de Campinas (Unicamp). “As favelas estavam se tornando reféns”, acrescenta.
Segundo Cavagnari, a participação da União — por meio das tropas militares — na crise do Rio não demonstra que o estado não tinha controle da situação. “Não houve colapso”, afirma. “O governo (fluminense) despertou e viu a magnitude do problema. Agora, o que se espera é que o dispositivo não desmanche”, ressalta o coronel.
Três eixos
A essência da Estratégia Nacional de Defesa está bem resumida no decreto presidencial que criou o serviço: “O Plano é focado em ações estratégicas de médio e longo prazo e objetiva modernizar a estrutura nacional de defesa, atuando em três eixos estruturantes: reorganização das Forças Armadas, reestruturação da indústria brasileira de material de defesa e política de composição dos efetivos das Forças Armadas”.
Aposta na sequência
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, deve ficar no posto que ocupa atualmente. Cota do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele teria sido convidado oficialmente pela presidente eleita, Dilma Rousseff, com quem já teria tido uma primeira reunião para definir reestruturações no setor de aviação civil. Dilma já demonstrou vontade, em outras ocasiões, de criar um órgão para cuidar exclusivamente do setor aéreo. As primeiras sondagens a Jobim, por meio de intermediários, ocorreram há pelo menos 15 dias.
Apesar de ser filiado ao PMDB, Jobim seria ministro da cota de Lula, com quem tem boas ligações. Ex-ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso, ele chegou ao governo Lula depois de passar pela Presidência do Supremo Tribunal Federal (STF). Recebido com desconfiança pelos militares inicialmente, o ministro se tornou depois um dos principais defensores da classe, inclusive na defesa da não punição de envolvidos na repressão durante a ditadura. Além disso, encampou as buscas de corpos da Guerrilha do Araguaia.
Uma das principais razões para a permanência de Jobim, além de ter controlado as tropas, foi a modernização das Forças Armadas, que há anos não recebia investimentos, cujo planejamento é para os próximos 20 anos. O Ministério da Defesa não confirmou a manutenção do ministro e nem a reunião que teria tido com a presidente eleita.(EL).
Fonte: CORREIO BRAZILIENSE, via NOTIMP