Lula engaveta decisões sobre temas polêmicos para preservar Dilma
Governo adia questões que podem tirar voto da petista como extradição de Battisti, compra de aviões e criação de empresa de logística dos Correios.
Marcelo de Moraes de Brasília
Para evitar desgastes na campanha da petista Dilma Rousseff, o governo federal decidiu congelar a discussão ou votação de temas considerados polêmicos até a realização das eleições. A própria candidata tem evitado assumir a defesa de propostas que possam abrir um debate negativo e atrapalhar sua candidatura.
É o caso, por exemplo, da recriação de um imposto para a Saúde. Depois da extinção da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), o governo estuda a volta de um tributo com a finalidade de ampliar as receitas disponíveis para o setor. Já existe a ideia de criar a Contribuição Social para a Saúde (CSS), com o apoio do governo.
Mas, como o tema é considerado extremamente desgastante junto à opinião pública, até Dilma tem se esquivado de defender a proposta.
Na quarta-feira, ela afirmou que o próximo presidente precisa dar prioridade à transferência de recursos para a Saúde. Mas fez questão de não se comprometer com a criação de um novo tributo para o setor, embora tenha lamentado a perda de arrecadação provocada pela extinção da CPMF, em dezembro de 2007, em votação do Senado.
"Eu não estou discutindo volta de contribuição. Estou discutindo aqui um programa para a saúde", disse Dilma, depois de visitar o Sarah-Centro, unidade mais antiga da Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação. "Ninguém pode achar que a situação seja confortável, tendo a saúde perdido R$ 40 bilhões", disse.
Battisti. A recriação de um imposto para financiar a saúde não é a única discussão polêmica que "desapareceu" da lista de prioridades do governo. A decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a extradição ou não do italiano Cesare Battisti continua sem ter previsão para acontecer. A razão é óbvia. Qualquer tomada de posição do governo sobre o assunto abre espaço para críticas dos adversários.
Se tratá-lo como terrorista e enviá-lo para a Itália, o governo abre brecha para a acusação de ter negado proteção para um perseguido político. Se decidir não extraditá-lo, ouvirá queixas sobre a suposta proteção a uma pessoa acusada de cometer crimes. Como o desgaste é garantido, o assunto foi para a gaveta durante o período eleitoral.
Aviões: Outro tema que parecia estar prestes a ser decidido era a decisão sobre quem deve fornecer os novos aviões para a Força Aérea Brasileira (FAB).
O governo prefere comprar os aviões da francesa Rafale por conta de uma parceria estratégica com o governo da França. Mas esbarra na resistência técnica apresentada por setores da Aeronáutica, que consideram os suecos Gripen melhores tecnicamente. Para que o assunto não seja explorado na campanha, a decisão deve esperar pelo menos mais algum tempo.
Existem temas que nem provocam tanta discussão dentro do governo, como no caso da escolha dos aviões, que ainda divide opiniões. Mas possuem teor capaz de criar marola eleitoral.
Energia nuclear. Dentro do governo existe praticamente o consenso pela necessidade de construções de usinas nucleares. Mas o tema sempre foi delicado dentro do País.
Já existe a previsão até mesmo de construção de novas usinas, mas definir essa situação agora poderia abrir um debate sobre impacto ambiental e custo da obra.
Especialmente numa eleição que inclui uma candidata tão vinculada ao movimento ambiental como a senadora Marina Silva, do PV, que foi ministra do Meio Ambiente no governo Lula.
Outro assunto que não provoca racha dentro do governo mas pode se tornar um problema eleitoral é sobre a restrição à compra de terras no Brasil por estrangeiros.
Nesse caso, a preocupação é que a candidata governista possa ser classificada como representante de um governo xenófobo e isso funcione para provocar dúvidas entre investidores estrangeiros. Por conta disso, o tema também foi guardado temporariamente nas gavetas do governo até depois da eleição.
Além desses temas, os aliados de Dilma concordam que o governo faz bem em evitar precipitação na criação de uma nova empresa de logística para os Correios.
A queda da diretoria da empresa há duas semanas já provocou turbulências dentro do governo, incluindo entre aliados do PMDB, responsáveis pelo controle político dos principais cargos da estatal.
Por conta disso, Lula já decidiu que vai investir na reestruturação e na reorganização da empresa antes de autorizar a criação da nova empresa, responsável pela futura montagem de uma frota de aviões cargueiros.
Com estimativa de gastos de US$ 400 milhões, o presidente não quer alimentar a discussão de que está criando uma estatal para abrigar aliados políticos do governo, especialmente numa área desgastada pelos problemas administrativos. Assim, a criação da estatal ficará para ser definida pelo sucessor de Lula no Palácio do Planalto, a partir de 2011.
Fonte: O ESTADO DE SÃO PAULO, via NOTIMP