Compadre de Lula ''nomeia'' nos Correios
Sugerido por Roberto Teixeira, novo diretor de Operações tem ligações familiares com empresa que presta serviços para a estatal
Leonencio Nossa e Karla Mendes
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu no dia 28 de julho a cúpula dos Correios por temer que o fisiologismo partidário ampliasse a crise administrativa na estatal e respingasse na campanha eleitoral, mas a iniciativa pode ter sido infrutífera. O novo diretor de Operações dos Correios, Eduardo Artur Rodrigues da Silva, assume o cargo sob uma nuvem de suspeita.
Conhecido no setor da carga aérea como "coronel Artur" ou "coronel Quaquá", ele chegou à estatal com o apoio do compadre de Lula, o advogado Roberto Teixeira. Presidia uma empresa de transporte de mala postal, a Master Top Linhas Aéreas (MTA). Vinte dias antes de ser escolhido para a função, a MTA arrematou o contrato de uma das principais linhas da estatal, a Linha 12, que opera no trecho Manaus-Brasília-São Paulo. A empresa, com sede em Campinas, venceu o pregão eletrônico com o lance de R$ 44,9 milhões.
É uma linha estratégica nos negócios dos Correios - representa 13% do valor total da malha e 14% da capacidade de carga contratada. Ao assumir a diretoria nos Correios, no dia 2 de agosto, o coronel entregou o comando da MTA nas mãos de uma filha, Tatiana Silva Blanco.
Com essa triangulação, a MTA tem agora a família Rodrigues da Silva como contratada e, ao mesmo tempo, contratante. Em site na internet, a MTA destaca que tenta ser uma "extensão" das empresas com as quais mantém parceria.
Além desse aspecto da relação entre os Correios e a MTA, há outro fato a ser observado: um dia antes da escolha do coronel Artur para a diretoria de Operações e menos de uma semana antes de sua posse, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) anulou a suspensão da certificação da Master Top Linhas Aéreas. No dia 22 de julho, a MTA fora multada por excesso de trabalho de seus tripulantes e teve o Certificado de Homologação de Empresa Aérea suspenso pela Anac.
A suspensão foi retirada pela agência e a decisão publicada no Diário Oficial da União do dia 27, véspera do anúncio da indicação do coronel Artur para o cargo nos Correios. A Anac aceitou uma proposta de mudança na escala de trabalho dos funcionários e liberou a empresa para voltar a voar.
VarigLog e Teixeira: O coronel Artur, de 61 anos, é um personagem do polêmico processo de venda da VarigLog, em 2008. Em 8 de abril daquele ano, ele foi nomeado para o conselho de administração da empresa de transporte de cargas desmembrada da Varig, que tinha Roberto Teixeira como principal advogado e consultor.
À época, a Fundação Ruben Berta, uma das acionistas da empresa, denunciou uma fraude na ata da reunião, que teria sido patrocinada pela advogada Larissa Teixeira, filha de Roberto, e pelo representante do fundo americano Matlin Patterson, que também participava do negócio. A Fundação Ruben Berta disse que não mandou representantes para o encontro. Larissa respondeu que o representante da fundação, João Luís Bernes de Souza, estava presente. Bernes negou a versão apresentada pela advogada.
O que não ganhou destaque, à época, foi o motivo da realização da assembleia. O encontro serviu para nomear o coronel Artur como integrante da VarigLog. O caso está sendo analisado pela Polícia Federal e pela 17.ª Vara Cível de São Paulo.
Da assembleia até meados de outubro daquele ano, o coronel Artur presidiu a VarigLog. No período, acumulou o cargo com a presidência da MTA. Artur se apresentava como presidente da MTA, "empresa que presta consultoria e administra a VarigLog". A empresa do coronel aumentou de 2 para 11 o número de voos cargueiros após dar consultoria à companhia VarigLog, defendida por Teixeira.
A MTA também foi contratada pelo chinês Lap Wai Chan, representante no Brasil do fundo americano Matlin Patterson, que tinha a maioria do capital da VarigLog. O advogado de Chan era Roberto Teixeira, acusado pela ex-diretora da Anac Denise Abreu de tentar influenciar a agência a aprovar a venda da Varig para a VarigLog de Chan.
Um ano antes, em 2007, Teixeira participou das negociações de venda da Varig para a Gol, da família Constantino. O advogado defendia o fundo Matlin Patterson e três outros sócios da Varig. Um desses sócios, Marco Antônio Audi, disse que Teixeira recebeu US$ 5 milhões para usar sua suposta influência no governo e derrubar exigências impostas pela Anac.
O advogado negou as informações de Audi.
Padrinho: Um dos entraves para a nomeação do coronel Artur para o cargo nos Correios era justamente a relação dele com uma empresa que presta serviços para a estatal. Foi dado então um verniz político para a nomeação, pois faltava um padrinho para o indicado. À época da nomeação foram divulgadas informações apontando o senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO) como padrinho do novo diretor. "Ah, estou aqui, no Tocantins, fazendo campanha há tempo", disse o parlamentar ao Estado, em tom de queixa. "Essa informação (da indicação do coronel) não procede, não tem nada disso."
À frente da diretoria de Operações dos Correios, o coronel Artur tem por tarefa tirar do papel o plano de reestruturação da estatal, que se arrasta há uma década e inclui a criação de uma subsidiária com aviões para transportar a carga especial de encomendas.
Negócios da empresa cresceram a partir de ligação com Teixeira
A Master Top Linhas Aéreas (MTA), empresa montada pelo coronel Eduardo Artur Rodrigues da Silva, se especializou em contratar terceiros para serviços de transporte de cargas e prestar serviços de "despachante" para companhias brasileiras que compravam peças no exterior ou estrangeiras interessadas em operar no País. Os negócios da MTA só ganharam impulso em 2008, a partir da ligação de seu então presidente, o coronel Artur, com a VarigLog, empresa defendida pelo advogado Roberto Teixeira.
Sem frota, a MTA foi registrada em 2006 na Junta Comercial de São Paulo por Jorge Augusto Dale Craddock e Anna Rosa Pepe Blanco, sogros de Tatiana Silva Blanco, filha do coronel Artur. Em dezembro daquele ano, conseguiu autorização da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para operar no setor de transporte aéreo de cargas e mala postal nacional e internacional por três anos, com possibilidade de prorrogação por mais sete anos. Em dezembro de 2009, conseguiu autorização de dez anos - prazo maior possibilitado pelas novas regras do setor.
A MTA iniciou seus voos próprios com um velho DC-10, modelo de avião fabricado nos anos 1970 e 1980, o mesmo que era usado pela antiga Varig na rota Guarulhos-Brasília. Muitos dos 17 aviões da companhia foram vendidos para pequenas empresas Aéreas e transformados em cargueiros.
O sucateamento de companhias como Varig, Vasp e Transbrasil garantiu a frota de pequenas empresas de carga que nunca tiveram linhas de financiamento definidas pelos bancos oficiais, avaliou um antigo dirigente do extinto Departamento de Aviação Civil (DAC). Foi o caso da empresa do coronel Artur.
Ao longo de 2008, a MTA adquiriu outros três DC-10 e passou a operar na concorrida rota Campinas-Manaus. E também passou a atuar na linha Guarulhos-Brasília e Guarulhos-Nordeste. A MTA ainda faz charters entre Campinas e Miami.
Ascensão: O aumento dos negócios da MTA significou a ascensão social da família nos banquetes do setor. Entre 24 e 26 de junho de 2008, Tatiana era uma das quatro representantes de empresas Aéreas privadas que acompanharam dirigentes da Anac, secretários dos ministérios do Turismo e das Relações Exteriores em encontro com autoridades de Washington para discutir normas de voo entre os dois países. Ainda integravam o grupo uma subordinada do coronel Artur na VarigLog e representantes da TAM.
Coronel Artur é homem de hábitos simples, dizem duas pessoas que participaram com o militar da reserva de rodas de conversas de lobby. Formado na Escola Preparatória de Cadetes do Ar, em 1965, ele trabalhou na Força Aérea Brasileira e no DAC. O estilo "duro" é outra marca. Sindicalistas reclamam que o coronel não atendeu, até agora, pedido de conversas com a categoria.
Discrição: Nos corredores e gabinetes da empresa, funcionários dizem que ele é homem discreto. Foi assim que o coronel acompanhou o presidente Lula em viagem a Israel e à Palestina, em março. Estava no grupo de convidados pelo Itamaraty para fazer negócios no Oriente Médio. A jornalistas, coronel Artur disse que tinha planos "maiores" e pretendia buscar parcerias com empresas israelenses que tinham interesse em operar a rota Tel Aviv-São Paulo.
Fonte: O ESTADO DE SÃO PAULO, via NOTIMP