Crescimento da aviação regional cria polos em aeroportos fora do Rio e SP
Estratégia. Empresas como Trip e Passaredo mais que dobraram o número de passageiros transportados no último ano, usando a estrutura de aeroportos como o de Ribeirão Preto (SP) e de Cuiabá para distribuição dos voos para outras cidades
Glauber Gonçalves
O desenvolvimento de novos polos regionais, a ampliação das fronteiras agrícolas e o crescimento da classe C têm impulsionado o mercado de aviação regional no Brasil. Com a expansão de novas ligações aéreas, as companhias estão concentrando suas operações fora de grandes centros e apostam na criação de hubs regionais - isto é, aeroportos a partir dos quais os passageiros podem ser redistribuídos para outros destinos.
É o caso, por exemplo, de Ribeirão Preto (SP), Cuiabá e Recife. Segundo o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Transporte Aéreo Regional (Abetar), Apostole Lazaro Chryssafidis, as companhias regionais têm necessidade de concentrar suas operações em hubs regionais para estabelecer uma maior densidade de passageiros. "Isso permite atingir uma economia de densidade que reduz o custo operacional e racionaliza a malha", explica.
Detentoras da maior fatia dentro do mercado de aviação regional, a Trip Linhas Aéreas e a Passaredo são exemplos de índices elevados do aumento de demanda. De janeiro a maio deste ano, cresceram respectivamente 109% e 155%, em comparação ao mesmo período do ano anterior.
A Trip escolheu Cuiabá como base de um de seus hubs regionais. A empresa desenvolveu na capital mato-grossense o conceito de duas ondas. "Durante dois horários por dia, chegam vários aviões da Trip na mesma hora, dando um amplo poder de conexão", explica o presidente da companhia José Mário Caprioli. "Isso é um pouco o embrião de como o sistema vai evoluir. Já demonstra essa descentralização."
As companhias aéreas têm sido atraídas para o Centro-Oeste principalmente em função do desenvolvimento trazido pelo agronegócio, explica Apostole, da Abetar. "Vimos muitas cidades em Mato Grosso nascerem em função disso", disse. De Cuiabá, é possível viajar em voos diretos tanto para cidades do interior, como Ji-Paraná e Vilhena (RO), Rondonópolis e Sinop (MT), como para capitais como São Paulo e Campo Grande.
Além do hub de Cuiabá, a Trip também estuda implementar uma base em Recife, cidade em que a aviação regional vem crescendo em razão do desenvolvimento industrial pelo qual passa o Estado de Pernambuco. "Tem o Porto de Suape. É um conceito de porto-indústria que está numa fase muito intensa de investimento e isso puxa também a aviação regional", diz Carlos Campos, técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Novata. A capital Pernambucana foi escolhida pela Noar, de Caruaru, no interior do Estado, que começou a voar no mês passado. "Pegamos Recife, fazendo o processo de uma malha complementar ao que as outras companhias comerciais nacionais oferecem", conta o diretor executivo da companhia Marjone Camelo. A partir da capital, a empresa voa para Caruaru, Maceió e Aracaju.
"Queremos suprir a carência de ligações entre determinadas cidades que são polos no Nordeste", explica Camelo. Em agosto, a empresa deve começar a voar também para João Pessoa, Natal, Mossoró (RN) e uma outra capital da região, a ser definida entre Fortaleza e Salvador. Segundo ele, o aumento das ligações entre as capitais nordestinas facilita o ambiente de negócios, permitindo que executivos se locomovam na região sem precisar fazer conexões em Brasília.
Para o secretário do Turismo de Pernambuco, Paulo Câmara, o bom momento da aviação regional no Estado se deve a um processo de interiorização do desenvolvimento. "Muitas empresas estão se instalando no interior do Estado, em cidades como Petrolina e Caruaru".
Outra companhia de olho no Nordeste é a Passaredo, que lançou no mês passado um voo ligando Recife a Ribeirão Preto. A cidade do interior paulista funciona como hub para a empresa, que já conta hoje com voos diretos para sete capitais brasileiras, conta o presidente da companhia, José Luís Felício Filho. "Nossa malha é muito ligada ao desenvolvimento do agronegócio." Para ele, a expansão do setor sucroalcooleiro tem fortalecido a aviação regional na região.
Falta de estrutura em aeroportos do interior ainda é um entrave
O crescimento do mercado de aviação regional no Brasil tem esbarrado em problemas burocráticos e de infraestrutura. Administrados por Estados e municípios, os aeroportos de cidades de médio porte enfrentam escassez de recursos, segundo o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Transporte Aéreo Regional (Abetar), Apostole Lazaro Chryssafidis.
"É um problema que as empresas estão enfrentando. A Anac tem publicado algumas resoluções que visam aumentar a segurança nos aeroportos, mas dá pouco tempo para adequação. Isso exige uma série de investimentos de governos estaduais e municipais. Sem isso, gera-se um estresse violento, porque limita a operação das empresas com planos de investir", afirma.
Para Chryssafidis, algumas empresas têm de deixar de operar em aeroportos que não conseguem cumprir as novas regras de segurança. "O empresário demora alguns anos para planejar o investimento e quando começa a receber as aeronaves, percebe que aqueles aeroportos não são mais operáveis", diz.
O presidente da Trip, José Mário Caprioli, afirma que a companhia tem enfrentado essa realidade. "Carauari, no meio da Amazônia, é uma cidade em que tínhamos voo e tivemos de suspender. Há hoje 20 aeroportos que ainda têm operações da companhia, mas nos quais não podemos expandir porque a infraestrutura continua limitada."
A Noar, empresa que começou a voar em junho no Nordeste, tem feito parceria com governos estaduais para adequar os pequenos aeroportos às exigências da Anac. Em Caruaru (PE), a empresa auxiliou na criação de um plano de segurança.
O governo federal vem estudando medidas para acabar com os entraves para a aviação regional. De acordo com Fernando Soares, diretor do Departamento de Política de aviação da Secretaria de aviação Civil, a União tem um projeto para destinar mais recursos para a melhoria de aeroportos. Ele afirma, porém, que os Estados recebem recursos da Cide, contribuição sobre a venda de petróleo e derivados, que também podem ser usados para este fim.Fonte: O ESTADO DE SÃO PAULO, via NOTIMP