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Sem medo de voar






Antônio Machado

Lula já tem tudo para atacar o caos dos aeroportos, até minuta de decreto da anac. Falta decidir o diagnóstico sobre a deficiente estrutura dos grandes aeroportos é simples: os terminais de passageiros e carga ficaram acanhados, os pátios já não comportam mais o tráfego de aeronaves e as pistas não dão conta dos pousos e decolagens. Em síntese: há mais aviões e passageiros que aeroportos decentes, confortáveis e seguros.

A economia alçou voo e a infraestrutura continua grudada ao chão. O fluxo de passageiros cresceu 80% nos últimos seis anos, graças à expansão da renda, do maior acesso ao crédito e à redução relativa das tarifas, sem investimentos para acomodar o aumento da demanda.

Se há mais pessoas querendo viajar, tem de haver mais aviões para transportá-las. As empresas aéreas expandiram a oferta. E a anac, a Agência Nacional de Aviação Civil, fez o quê? Cortou as asas das empresas, limitando o número de pousos e decolagens nos aeroportos saturados, como Congonhas, Guarulhos, Brasília e Santos-Dumont.

O resultado é o aumento da demanda reprimida, com prejuízos para os passageiros e as empresas aéreas, em última instância à própria Infraero — a empresa estatal que é uma espécie de cumulus nimbus a barrar as propostas que não satisfaçam o seu estamento. A Infraero administra 67 aeroportos, representando 97% do tráfego aéreo.

Medida tão patética só se justificaria se a solução do problema fosse complexa. Não é. Há dinheiro para os investimentos, se não público, de gente interessada em fazer e operar aeroportos. Também há projetos e expertise. Empreiteiras nacionais dominam há muitos anos a engenharia de aeroportos, e aprenderam a operá-los.

A própria anac já tem pronta minuta de decreto presidencial, que estabelece marco regulatório complementar ao vigente, em que cabe ao Estado a operação exclusiva dos serviços aeroportuários.

No novo regime, a operação de aeroportos e terminais existentes, assim como a construção de novos, poderia ser licitada a empresas privadas pelo regime de concessão. O presidente Lula já conversou com empresários sobre tal iniciativa e confirmou o interesse.

Então, por que viajar de avião, mesmo um voo curto de São Paulo a Brasília, de Belo Horizonte ao Rio, virou uma agonia com as filas, sem falar na loteria de assentos nas férias e véspera de feriados?

Mas há resposta única. Há uma fila delas, tão grandes como as que se formam pelas manhãs e fins de tarde nos check-in dos aeroportos de várias capitais, sem sensibilizar os governantes. Talvez porque só entrem em aeroportos pela ala VIP e viajem em jatos oficiais.

Biombo da estatização

Não há teto para que decolem as decisões. Por quê? Além de lento para conduzir a solução dos problemas de infraestrutura, o governo não dispõe de burocracia empreendedora no setor aéreo, como há no sistema elétrico e na Petrobras. Parte dela, além disso, manipula a bandeira da estatização, envolvendo sindicatos e políticos, para preservar seus feudos de poder e de negociação privilegiada.

Não há ideologia no debate entre a operação pública ou privada de aeroportos, viabilizada pelo regime de concessão pensado por Lula. Só há o choque entre o interesse público muito mal atendido e o de burocratas incrustados na disfuncional estrutura do setor aéreo.

A paciência esgotada

A cadeia de comando está fragmentada entre Ministério da Defesa, Aeronáutica, Casa Civil, anac, Infraero, e vai por aí. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, já considerou diversas propostas para sacudir a Infraero. Privatizar foi uma delas. Não decolou. Depois, vender parte das ações no mercado e trazer executivos de fora para oxigenar a administração. Todos os vôos de Jobim foram cancelados.

O setor de controle de voos, atribuição da Aeronáutica, também já deu todos os problemas, como os que levaram ao caos nos aeroportos entre 2006 e 2007, que a paciência poderia tolerar. A anac, tocada por uma funcionária leal a Jobim, Solange Vieira, tenta organizar o caos. Mas só o amplia ao cortar voos nos aeroportos saturados.

Solução começa a sair

O que não se fez em oito anos de governo dificilmente será feito em seu final. Já há um avanço com a decisão isolada de se licitar a construção e operação de um novo aeroporto na cercania de Natal.

Pelo que diz o ministro Jobim, será um laboratório para a reforma do marco regulatório. É pouco. Há condições também para se licitar tanto a terceira pista e o terminal de Guarulhos, onde a saturação é das mais graves no país, como o terceiro aeroporto na cidade, esse 100% privado, o que talvez exija autorização especial do governo. A Infraero, em nenhum desses casos, diminui. Torna-se é operante.

Vexame em 2014 e 2016

Os políticos, quando não tem em mãos a caneta que lhes dá o poder, costumam criticar as indecisões com o argumento de que faltaria a vontade política. Não é bem isso. Escassa é a vontade de enfrentar os lobbies que atrasam o país. No caso do projeto de um aeroporto privado em São Paulo, por exemplo, há no governo quem queira dar a autorização, mas restringi-lo à aviação executiva. De imediato, o resultado seria um pequeno desafogo de Guarulhos, mas sem resolver o caos nem a situação também crítica em outras cidades. O capital privado provavelmente se desinteresse pelo projeto, o que parece ser o objetivo: mudar para que tudo continue igual. Se for essa a intenção, esqueçam Copa do Mundo e Olimpíadas: será um vexavme só.

Fonte: CORREIO BRAZILIENSE, via NOTIMP



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