Otan critica ataque israelense a pedido da diplomacia turca
Aliança atlântica aprova resolução que exorta Israel a investigar operação em alto-mar e a libertar manifestantes
Sob pressão do governo turco, os 28 países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) reuniram-se em caráter emergencial ontem e emitiram uma nota exigindo que Israel investigue a morte de nove ativistas no assalto, em águas internacionais, à frota que ia para a Faixa de Gaza. O inquérito, exortou a aliança militar, deve ser "imediato, imparcial e confiável".
O secretário-geral da Otan, o dinamarquês Anders Fogh Rasmussen, pediu ainda que Israel libere imediatamente os civis detidos e embarcações apreendidas na operação em alto-mar.
As condenações a Israel e o embate turco-israelense criam uma situação inédita na história da aliança atlântica. Vizinha da Síria, Iraque e Irã, a Turquia é um país-chave da Otan, organização que integra desde 1952. Embora não seja parte da organização ocidental, Israel mantém estreitos laços com a Otan, especialmente no combate ao terror na região do Mar Mediterrâneo.
Partiu de Ancara a decisão de reunir os 28 membros da Otan em uma condenação uníssona a Israel. Mas a diplomacia turca - em um sinal de moderação - não solicitou à aliança uma ação coletiva contra os israelenses, capaz de abalar os laços de Israel com a Otan.
"11/9 turco".
Ontem o ministro das Relações Exteriores turco, Ahmet Davutoglu, voltou a criticar duramente o assalto israelense no Mar Mediterrâneo. "Psicologicamente, esse ataque é como um 11 de setembro para a Turquia", disse o chanceler em Washington, momentos antes de se encontrar com sua colega americana, Hillary Clinton.
Davutoglu abriu um mapa diante dos repórteres e apontou o local onde supostamente teria ocorrido a tragédia, a 72 milhas náuticas da costa de Israel - portanto, em águas internacionais. "Os israelenses acreditam estar acima de qualquer lei", criticou o chanceler, comparando-os a "piratas da costa da Somália".
O chanceler deveria encontrar-se ontem com Hillary para discutir o acordo Brasil-Turquia-Irã. O ataque israelense aos manifestantes, porém, dominou a conversa entre as duas autoridades. "Espero que os EUA demonstrem solidariedade conosco. Não estou muito contente com as declarações que os americanos fizeram ontem", disse Davutoglu.
A tragédia de segunda-feira levou à pior crise nas relações entre Israel e Turquia, que por décadas mantiveram uma acentuada cooperação política e econômica. Analistas reconhecem os estragos na parceria, mas afirmam ainda ser cedo para dizer que os governos turco e israelense andarão para lados opostos.
A Turquia, por exemplo, não cancelou importantes compras de armamento israelense, incluindo uma de aviões não-tripulados no valor de US$ 183 milhões. Setores nacionalistas em Ancara, sobretudo militares, veem Israel como um importante aliado na luta contra a insurgência curda.
As desavenças seriam questões de governo e não de Estado, diz Ofra Bengio, da Universidade de Tel-Aviv. "Agora estamos no meio de uma crise. Mas governos vão embora."
PERGUNTAS E RESPOSTAS
As dúvidas sobre o ataque
1. Quem integra a frota humanitária?
Cerca de 700 ativistas de 42 países estavam no comboio, a maioria da Turquia. A manifestação foi organizada pela ONG islâmica turca Fundação para os Direitos Humanos e Liberdade e Resgate Humanitário (IHH). A ONG, que atua em áreas de guerra e conflito, é acusada de ter ligações com a Al-Qaeda e grupos jihadistas.
2. Quem iniciou a violência na invasão?
Ativistas dizem que os militares começaram a atirar assim que invadiram o navio. Autoridades israelenses afirmam que seus agentes foram atacados primeiro. Os ativistas teriam usado barras de ferro, facas e abriram fogo com uma arma tomada de um dos soldados.
3. A ação militar de Israel foi legal?
A ação ocorreu em águas internacionais, onde, segundo lei marítima internacional, nenhuma embarcação legal pode ser abordada, segundo o Princípio Internacional de Liberdade em Alto-Mar, de 1982. Alguns juristas, porém, interpretam que a ameaça de a frota invadir águas territoriais da Faixa de Gaza, sob bloqueio, exporia os navios à interceptação. Além disso, a comunidade internacional critica Israel pelo uso de força desproporcional durante a abordagem.
4. Quais as implicações para as negociações de paz?
Israel e a Autoridade Palestina, liderado por Mahmoud Abbas, retomaram o diálogo após dois anos de interrupção. A pressão internacional pode ainda fazer com que Israel repense a estratégia de punir o Hamas e atingir a população.
Fonte: O ESTADO DE SÃO PAULO, via NOTIMP